20/09/2008

Um jardim lindo

Marcos era um homem milionário que comprou um castelo na Europa. Tudo bem que falar que ele é milionário é redundância, já que o homem compra um castelo enooorme... O mais bonito de toda a Espanha, com os móveis mais caros, nos padrões feudais, lá no interior do país mas, enfim, estava olhando, pela internet, fotos do castelo aqui do Brasil mesmo e o achou lindo. Pensou em levar amigos seus de vez em quando pra passar uns tempos na Europa dentro de seu novo lar alternativo.

A história de como Marcos ficou milionário em sua vida é muito grande, já que dura uma vida quase inteira. Então não vou contar para vocês. O fato é que Marcos sempre foi muito desprendido do material, bondoso, caridoso, gente fina, enfim... Quebra o mito de que os milionários são todos uns malas, quer dizer, talvez isso seja verdade para quem nasceu rico. Marcos nasceu muito pobre e ganhou aos poucos. Por isso sempre deu valor ao esforço humano.

Eu tô aqui falando falando e não continuo o conto. Quando for assim é só você que está lendo saltar umas linhas por que o que está a sua frente não são palavras de grande importância. O fato é que quando Marcos foi pela primeira vez à sua casa nova conhecer todos os cômodos já que só tinha visto fotos pela internet, se deparou com um grave defeito na casa. Ela tinha um fosso (nessa hora você fala "é claro que tinha um fosso, você não falou de um castelo medieval?!"), um fosso que era muito maior do que parecia ser nas fotos, quer dizer, claro que o castelo continuava maravilhoso, era cada torre linda, mas o fosso tornava tudo mais feio, não... feio não é bem a palavra... eu diria mais... amedrontador! Isso mesmo, o fosso tornava tudo mais amedrontador. Marcos não conseguia ver a vivacidade de dentro dos cômodos ao olhar de fora, porque só sentia medo. Mas foi aí que nosso protagonista teve uma idéia. Ele foi a uma loja especializada lá em Madrid, comprou muita terra, uma pá, e foi tampar o buraco do fosso. Você deve estar imaginando como ele ia colocar toda aquela terra pra dentro com apenas uma pá, quer dizer, ele não seria capaz de usar duas, quando disse com uma pá eu quis dizer sozinho mesmo... mas eu já havia te dito que Marcos valorizava o esforço humano. Sem contar que isso o tornaria um milionário excêntrico... Olha que legal!

Enfim, ele trabalhou tanto que se feriu muito durante o trabalho, mas ele achava que mudar a fachada do castelo era algo que valia seu esforço. Depois de meses tentando fechar o fosso do castelo, parecia que o trabalho não tinha fim, mas Marcos passou o braço na testa pra tirar o suor e continuou. Jogava terra, jogava mais e mais terra, até que Marcos, tonto de cansaso, agoniado de tanto trabalhar, não aguentando mais, olhou para o trabalho pronto. Estava lindo o castelo... com sua fachada mais proxima e aberta para quem quisesse chegar perto, faltava só colocar grama em volta onde havia apenas um buraco sem graça. Marcos passou a mão pela testa de novo, mas agora satisfeito, com um sorriso de orelha a orelha, e foi para Madrid novamente, buscar a grama e as flores, pois ia colocar um jardim lindo em volta do castelo.

Marcos ficou quase o dia todo em Madrid, consultando com os melhores decoradores, comprando as flores mais bonitas e os gramados mais belos, o jardim estava pronto na sua cabeça, só faltava montar. Quando ele chegou em sua casa, o céu já escuro, pensou em dormir, para terminar seu trabalho amanhã. Marcos adorava dormir quando tinha trabalhado o dia inteiro, ele sempre dizia "é por isso que eu gosto tanto de trabalhar... O descanso chega a dar prazer quando a gente tá realmente cansado...", enfim, Marcos entrou no salão maravilhoso de entrada, com todos aqueles... "Pera aí! cadê os móveis?" Marcos sentiu nessa hora um cano gelado encostar na sua nuca e uma voz, em meio a muitas gargalhadas ao fundo: "Muchas gracias Marcos Campos, sempre quisemos roubar todas essas obras de arte caríssimas e nunca conseguimos maquinar uma forma de passar pelo fosso sem sermos percebidos. Foi muito gentil da sua parte trazer também uma opção de jardim lá fora para nós! Mas, particularmente, prefiro trazer umas escavadeiras pra cá para refazer uma segurança tão boa... Tem muito ladrão por aí sabe? hehe... Aliás, aqui tem muita coisa inútil agora (Marcos, nessa hora, gelou não só na nuca do cano, mas em todo o seu corpo)... Não é mesmo rapazes? (mais gargalhadas) Ainda mais que temos tudo isso que está aqui dentro, e a escritura do castelo! Bem... o que mais posso querer, diga adeus Marcos Campos!

Ele tentou se virar, mas a única coisa que percebeu do momento foi o som de uma explosão forte, e distante de qualquer pessoa fora do castelo.

03/09/2008

Quase! Quase!

Um homem, entre um cigarro e outro, imprime um monte de papéis iguais. Um nome, leve descrição de comportamento ("nunca termina o que começa") e olhinhos fitando quem olha a foto. Olha pra um daquele monte de anúncios.

...

Carros passando, barulho. Barulho. Uma roda de bicicleta! Quase! Quase! Petelecos, onde?! Onde?!

...

Ele senta de novo a frente do computador. Não olha pra tela, olha pro nada, pela janela do apartamento. Ele lembra da alegria de ambos quando iam passear... Respira fundo, põe a mão sobre os joelhos e força para se levantar

...

uma bolinha! Quase! Quase! Que menina esquisita que gritou! cadê aquele moço?! Ai que fome!

...

Pega calmamente a pilha de anúncios do desaparecimento triste. Desce de escadas, não quis descer sete andares de elevador porque nunca desceram juntos de elevador. Abre a porta e prega o primeiro no quadro de avisos do condomínio.

...

Olha! Um amigo enorme! Corre! Quase! Quase! Rodas! Muito grandes! Maiores, maiores. Cadê meu dono?!

...

Sai pela porta do apartamento, estão recolhendo um corpo de cachorro na rua... Atropelado por um caminhão de ração de cachorro, com um cachorrão no lado. Ele ri pra se mesmo "...que irônico..." finalmente ele fica triste. Se lembra do próprio cachorro. "Quase" -Ai como eu gostava de ficar gritando o nome dele! "Quase! Vem cá Quase!" Será que ele também morreu?